quarta-feira, 16 de maio de 2018

Filha de Ana Jansen morreu em decorrência de complicações pós-parto em 1857



Por Euges Lima (historiador )
eugeslima@gmail.com





Documento inédito encontrado esclarece sobre as circunstâncias da morte de Ana Augusta Jansen Ferreira, filha de Ana Joaquina Jansen Pereira, a lendária Ana Jansen com o rico comerciante português, Coronel Isidoro Rodrigues Pereira.

Ana Augusta casou-se aos 18 anos, com o Dr. Manoel Jansen Ferreira, seu primo, unindo, portanto, os dois mais poderosos ramos dos Jansen no Maranhão, deixou 11 filhos e faleceu aos 33 anos, em 1857, 24 horas após dar à luz o seu último filho, em decorrência de complicações pós-parto, mesmo depois de todos os esforços de uma junta composta dos cinco melhores médicos de São Luís para salvá-la. Seu corpo está sepultado na entrada da Capela Bom Jesus dos Navegantes na Igreja de Santo Antônio, Centro.

Pesquisando em Jornais do período sobre Ana Jansen, encontrei um detalhado texto publicado a pedido no Jornal "A Imprensa" de outubro de 1857, narrando esse trágico acontecimento que certamente casou muito sofrimento à "Rainha do Maranhão" e abalou toda sua família.

Até então não se sabia detalhes e maiores informações sobre o falecimento de Ana Augusta Jansen Ferreira. Dunshee de Abranches registra no seu livro "O Cativeiro", 1941, como foi seu casamento em pleno período da Balaiada: “ [...] naquele dia 15 de janeiro de 1839, realizara o casamento de suas duas filhas Ana Augusta e Ângela Isidora com o Dr. Manoel Jansen Ferreira e Inácio de Sousa Machado[...].”

Estava também presente nesse pomposo duplo casamento no sobrado à rua Grande de fachada de azulejos, pertencente à Donana, como era popularmente conhecida, João Francisco Lisboa, aliado político, do alto dos seus 35 anos, o mais talentoso membro do partido Bem-te-vi e a mais "fina flor do liberalismo do seu tempo."




Ana Jansen, retrato de 1869,
fonte: O Cativeiro, 1941.


domingo, 13 de maio de 2018

A LEI ÁUREA NO MARANHÃO*




Pe. João Dias Rezende Filho**



Com uma pena de ouro, confeccionada por meio de subscrição popular, a Princesa D. Isabel sancionou, na tarde de 13 de maio de 1888, a lei nº 3.353, que passou à História com o epíteto de Áurea, tanto pelo nobre metal da caneta usada por Sua Alteza para assinar o diploma legal quanto pela importância e alcance social de que a lei se revestia.
A repercussão imediata no Maranhão da lei mais célebre do Brasil é pouco conhecida, mormente magistralmente explorada na ficção por autores como, por exemplo, Josué Montello em Os Tambores de São Luís e Noite sobre Alcântara e Nascimento Moraes em Vencidos e Degenerados.

Um dos relatos históricos mais interessantes e ricos sobre a repercussão é o do memorialista Dunshee de Abranches. Em seu clássico O Cativeiro, o insuspeito historiador republicano, testemunha ocular da abolição, narra o entusiasmo dos maranhenses, sobretudo dos recém-libertos e dos líderes do movimento abolicionista. Eis um pequeno trecho da poética narração do velho Dunshee:

“Durante três dias e três noites a população escrava e, com ela, o grupo abolicionista de São Luís não dormiram. As explosões ruidosas dos entusiasmos dos defensores impertérritos da grande causa, escrevia eu logo depois tentando apanhar para a História o flagrante dessa hora memorável, vinham juntar-se as expansões ruidosas da imensa massa dos libertos que, abandonando de chofre as casas dos senhores, se haviam lançado nas ruas em irreprimíveis e tumultuárias manifestações de júbilo.”

“A alvorada do dia da Liberdade irrompera radiante e límpida. Céu azul, sem nuvens. O sol marcara todas as horas dessa jornada gloriosa. Cânticos, risos, gritos alegres por toda a parte. Desde cedo, engalanara-se subitamente a cidade. As calçadas ficaram cobertas de flores e folhagens. Os redimidos surgiam de cada canto em grupos álacres; carregavam braçadas de ramos e de palmas; engrinaldavam-se também julgando-se os verdadeiros heróis desse prélio momentoso” (DUNSHEE DE ABRANCHES, 1992, p.194)

Na antiga Igreja de Nossa Senhora das Mercês, ao lado do convento homônimo ainda remanescente, foi celebrado no próprio 13 de maio, à noite, um festivo Te Deum, cerimônia litúrgica na qual é executado o canto solene de antigo hino latino de ação de graças a Deus. A cerimônia promovida pelos padres e alunos do então seminário menor do Maranhão que funcionava naquele antigo convento dos mercedários foi muito concorrida. Estavam presentes o Dr. Moreira Alves, Presidente da Província, Dom Antônio Cândido de Alvarenga, Bispo do Maranhão e muitas outras autoridades, além de grande número de pessoas das mais diversas classes. Pregou, entusiasticamente, o Cônego Francisco José Baptista destacando que aquele Te Deum solene em agradecimento a Deus pelo fim da escravidão tinha lugar, providencialmente, na Igreja da ordem fundada em 1218, por São Pedro Nolasco, para promover a libertação de cristãos que, no norte da África, caíam escravos nas mãos dos mulçumanos.

Houve, infelizmente, quem se opusesse à Lei, como alguns fazendeiros da Vila de São Luís Gonzaga, como noticiou a Pacotilha de 17 de maio. O Presidente da Província, ao tomar conhecimento do fato, através de telegrama vindo de Bacabal, destacou para aquela vila 10 praças do 5º Batalhão de Infantaria sob o comando do Alferes João de Lemos, nomeado no mesmo ato delegado de polícia para aquela localidade com o intuito de garantir o cumprimento da lei.  Dentre os fazendeiros, à época chamados de lavradores, que resistiram à Lei Áurea, recolhemos do Jornal maranhense O Paiz de 18 de julho de 1888, os nomes de Victorino José Godinho, do Capitão João Jansen Pereira e do Tenente Coronel Júlio Máximo de Carvalho que no dia 10 de julho de 1888, reunidos na Câmara de São Luís Gonzaga, juntamente com vários outros ex-senhores de escravos, fizeram uma representação à Câmara dos Deputados pedindo indenização pela libertação de seus antigos cativos.

No dia 19 de maio, na Associação Comercial, foi realizada concorrida sessão solene dos empregados do comércio com a presença ilustre do Presidente da Província. Dentre os que usaram da palavra exaltando o 13 de Maio destacamos Hermenegildo Jansen Ferreira, presidente da Associação Comercial, Virgílio Cantanhede, Paula Duarte e Aristides Cunha. Logo após, uma passeata com participação de grande multidão que davam vivas à Regente e à extinção da escravidão desfilou pelas ruas da cidade.

As senhoras também promoveram uma passeata “em regozijo à lei que aboliu a escravidão no Império” conforme noticiou a Pacotilha do dia 21 de maio. Eram conduzidos estandartes com imagens da Regente, dos líderes do movimento abolicionista, como Joaquim Nabuco e os Conselheiros Dantas, João Alfredo e Vieira da Silva, este último, maranhense.
Foram promovidas outras importantes solenidades, como a da Câmara de Vereadores, em que discursaram o Vereador Manuel de Bettencourt e o jovem Dunshee de Abranches, orador oficial do Club Artístico Abolicionista Maranhense, a mais importante sociedade abolicionista do Maranhão, que promoveu no dia 28 de maio, no então Teatro São Luís, hoje, Arthur Azevedo, sua sessão solene de homenagem à Lei Áurea.

Friso que o abolicionismo e todos os personagens que nele tomaram parte, dentre os quais destacamos a Princesa Regente e o nosso conterrâneo Joaquim Serra, devem ser objeto de acurado estudo tendo em vista as questões que estão imbricadas no desfecho de todo esforço pela extinção da escravidão. Concluo citando o insuspeito prócer do abolicionismo, Joaquim Nabuco, em sua autobiografia Minha Formação.  Ao relatar a audiência com o Papa Leão XIII sobre a questão servil no Brasil, escreveu Nabuco: “Quanto à Família Imperial, repeti ao Sumo Pontífice, que o que há feito em nossa lei a favor dos escravos, é devido à iniciativa e imposição do Imperador, ainda que seja pouco” (NABUCO, 1999, p.198). Sobre a Princesa D. Isabel, acrescenta Nabuco: No dia em que a Princesa Imperial se decidiu ao seu grande golpe de humanidade, sabia tudo que arriscava. A raça que ia libertar não tinha para lhe dar senão o seu sangue, e ela não o quereria nunca para cimentar o trono de seu filho… A classe proprietária ameaçava passar-se toda para a República, seu pai parecia moribundo em Milão, era provável a mudança de reinado durante a crise, e ela não hesitou; uma voz interior disse-lhe que desempenhasse sua missão, a voz divina que se faz ouvir sempre que um grande dever tem que ser cumprido ou um grande sacrífico que ser aceito” (NABUCO, 1999, p.182) Viva a Lei Áurea! Viva o 13 de Maio! Viva o Brasil e o Povo brasileiro!



Bibliografia consultada


DUNSHEE DE ABRANCHES, João. O Cativeiro. 2ª edição. São Luís: Alumar e AML, 1992.

NABUCO, Joaquim. Minha Formação. São Paulo: Edibras, 1999.

Jornais Pacotilha e O Paiz – Acervo da Biblioteca Pública Benedito Leite




*Artigo publicado anteriormente em O Estado do Maranhão(12.05.2018) e no site do Instituto Cultural Dona Isabel I a Redentora(13/05/18).

** Pe. João Dias Rezende Filho é pesquisador e sócio efetivo do IHGM.